Remònd, René. Por uma História Política. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003.


Capítulo: “Por uma História Presente”. Nesse texto Remònd procura enfatizar como a história política se organizou ao longo das transformações conceituais e metodológicas da disciplina História ao longo do tempo, entendendo que assim como a sociedade esta em constante transformação, também a disciplina faz parte de tal processo histórico.


Remònd conceitua nesse momento a História Política que guarda ressonâncias com a que se produz nas pesquisas atuais, onde afirma o autor: “É a história do Estado, do poder e das disputas por sua conquista e conservação, das instituições em que ele se concentrava das revoluções que o transformavam”. (REMOND[1988], 2003 , p.15).
O segundo ponto de explicação da história política vem com a relação que o autor nos mostra as criticas que esta recebeu ao longo de seu processo histórico vindos da ascendente História Econômica e Social dos Annales, assim como, das teorias propostas por Marx e Freud, onde Remònd salienta: Marx e Freud, cada um a sua maneira e por vias diferentes, contribuíram igualmente para acabar com o prestigio da historia política. Um, fazendo da luta de classes, ela mesma resultante do processo econômico, o motor da historia, desclassificou o político. O outro, pondo em plena luz o papel do inconsciente atribuindo à libido, às pulsões sexuais a grande parte das responsabilidades pelos comportamentos individuais ocultou a ambição e o apetite de poder próprios do político. (REMOND [1988], 2003, p. 20).


Acerca das criticas que os Annales fazem são de que a História política é uma historia superficial, dos acidentes de conjuntura, onde não comportavam realidade, pois História Econômica e Social, segundo Remònd:
Seus pressupostos eram que os comportamentos coletivos tinham mais importância para o curso da História que as iniciativas individuais, que os fenômenos registrados numa longa duração eram mais significativos e mais decisivos que os movimentos de fraca amplitude, e que as realidades do trabalho, da produção, das trocas, o estado das técnicas, as mudanças de tecnologia e as relações sociais daí resultantes tinham mais conseqüências, e, portanto, deviam reter maior atenção dos observadores, que os regimes políticos ou as mudanças na identidade dos detentores de um poder cujas decisões, se entendia, só faziam traduzir o estado das forças sociais, ou refletir realidades anteriores as escolhas políticas. (REMOND [1988], 2003 , p.16.). Ainda salienta Remònd acerca do repudio dos Annales: “Era, pois, provavelmente inevitável que o desenvolvimento da História econômica e social se fizesse às custas do declínio da história dos fatos políticos, daí em diante lançada num descrédito aparentemente definitivo”. (REMOND [1988], 2003, p. 14.).
Encerrado esse ponto o autor fala do retorno ou ressurgimento da História política nos anos 60 ou 70, onde nos mostra que os fatos estão interligados entre si, ou seja, o econômico, o social, os culturais não estão e nem podem se dissociar do político, em que todos são determinantes e determinados no processo histórico.
Além disso, o autor acredita que o retorno ou ressurgimento do enfoque político se dá pelo fato da ampliação do papel do Estado na sociedade, e com isso, uma maior atenção aos fatos políticos.
A interdisciplinaridade é outro ponto destacado no retorno da historia política nas questões historiográficas da atualidade, onde esta usufrui de técnicas e métodos de ciências afins como é o caso da matemática da qual emprestou os dados estáticos, assim como
a historia quantitativa, e também, a ciência política como grande aliada nas relações de novos objetos a abordar.

As instituições que contribuíram para esse renascimento da História Política foram: VI Seção da École Pratique de Hautes Études em Sciences Sociales e a Fondation Nationale dês sciences Politiques.
No sentido da historiografia francesa Remònd destaca nomes como Charles Seignobos e André Siegried, onde o primeiro da sua contribuição sobre a diversidade dos temperamentos políticos e o segundo acerca da geografia eleitoral, alem de enaltecer o trabalho de Jean Jaques Chevalier com sua abordagem sobre o renascimento das idéias políticas, das instituições, correntes de pensamento e personalidades.
Em suma, autor faz um balanço da trajetória que a História política passou ao longo do processo histórico, num primeiro momento sendo hegemônica na explicação histórica, no segundo momento recebendo criticas que a desqualificavam e a colocavam no ostracismo, terminando por num terceiro momento falar do retorno da história política esperando que esta não seja apenas uma moda do momento ou um “veranico de maio”.

Capítulo: “Do Político”. Em Do Político,
 Remond busca explicitar como o político esta presente em todos os campos da sociedade, onde exerce uma interdependência e uma interdeterminância com as demais partes do todo (social, econômico, cultural, mental, cotidiano e etc). Para melhor exemplificar tal afirmação o autor nos mostra como os meios de comunicações apesar de não serem políticos podem se transformar em veículos da política, onde: Como mais forte razão, os meios de comunicação não são por natureza realidades propriamente políticas: podem torna-se transformar em veículos da política, onde: Como mais forte razão, os meios de comunicação não são por natureza realidades propriamente políticas: podem torna-se políticos em virtude de sua destinação, como se diz os instrumentos que são transformados em armas. (REMOND [1988], 2003, p.49). Conceituando a política como uma atividade que se relaciona com a conquista, o exercício e a prática do poder, fala que os partidos são
políticos por possuírem esta finalidade, onde seus membros possuem a motivação de chegar ao poder.
Em suma, o autor acredita que o político é uma construção abstrata,

assim como o econômico e o social, onde pode ser considerada a coisa mais concreta, pois com a política todos nos nós deparamos em nossas vidas já que esta interfere em nossas atividades profissionais e está presente até em nossa vida privada cotidianamente. www.webartigos.com – autor: Daniel Rodrigues de Lima.



                HISTÓRIA ECONÔMICA

João Fragoso e Manolo Florentino

A derrocada da historia econômica

A história econômica agoniza.
Tomando por base a produção de uma das mais prestigiosas (se não a mais importante) revistas de historia do mundo, os Annales, observam-se um contundente e inexorável declínio do numero de artigos ligados a história econômica.
No Brasil, os ecos deste movimento se fizeram sentir tardiamente. O caráter recente dos programas institucionais de pós-graduação em historia, cuja disseminação se deu na década de 1970, pode ajudar a explicar o fenômeno. Assim e que somente a partir dos anos 80 e que sentiríamos os primeiros efeitos do tornado vivido pela historiografia internacional.

A incrementar este recuo, os últimos 25 anos assistiram ao aparecimento de criticas cada vez mais contundente ao tipo de reflexão em meio ao qual era produzida a historia econômica. O que se traduziu, logicamente, em um questionamento mais e mais acentuado aos dois principais paradigmas explicativos sobre os quais se erigia a investigação histórica de ponta nas décadas de 1950 e 1960: a escola dos Annales e a historiografia marxista. Em termos gerais, o que os unia era a preocupação com a longa duração e a ênfase nas estruturas econômico-sociais para a compreensão das sociedades, lócus privilegiado ate mesmo para a compreensão da política e da cultura.

Do ponto de vista da praxeologia histórica, dai derivava a constante preocupação com a utilização de fontes propicia a quantificação e a seriação.
A partir do maio de 1968 catalisaram-se posições que vinham se desenvolvendo pelo menos desde meados dos anos 60, e autores como Jacques Le Goff e outros, atuando de dentro dos próprios Annales, puseram em duvida o predomínio desses princípios. Mesmo profissionais que, no inicio de suas carreiras, haviam se transformado em historiadores econômicos de peso, como Georges Duby e Emmanuel Le Roy Ladurie, acabaram por voltar-se integralmente para outros campos de estudo, como o das estruturas mentais.

O desconforto com primados como o das explicações econômico-sociais e da longa duração e com o que dai derivava em termos de métodos e técnicas de investigação se apossaram ate mesmo de autores vinculados aquela vertente que pode ser tomada como um dos principais núcleos incentivadores do economicismo do pos-45: o marxismo.

Tal e o caso de E.P.Thompson, que desde muito chama a atenção para o reducionismo econômico no que diz respeito ao estudo da historia social. Segundo ele, numa critica as curvas de preços e salários como elementos determinantes para a explicação dos movimentos de massa, tais índices menosprezariam as complexidades relacionadas às reações sociais e fatores culturais que informariam a conduta dos agentes envolvidos.

Seguindo o mesmo caminho, assim se expressa Carlo Ginzburg, em cujas obras marxistas clássicos como Gramsci e Bakhtin se fazem profundamente presentes:

“(...) não parece arriscado afirmar que a investigação quantitativa de longo período pode também obscurecer e distorcer os fatos (...) Na perspectiva de longo período e difícil compreender os problemas quotidianos da sobrevivência (...) A vida real e largamente posta a margem e a visão de longo período pode gerar uma abstrata e homogeneizada historia social desprovida de carne e sangue, e não convincente apesar de seu estatuto cientifico”.

Esses críticos da historia econômica e social apresentam profundas diferenças entre si. A comprová-las, para o caso de Thompson, por exemplo, esta a afirmação de que:

“a experiência de classe e determinada, em grande medida, pelas relações de produção em que os homens nasceram — ou entraram involuntariamente”.

Contudo, a retração da reflexão economico-social e tão profunda que obscurece estas discrepâncias, de tal modo que uma síntese do estado em que se encontra hoje a questão pode ser encontrada na afirmação de que

“(...) as relações econômicas e sociais não são anteriores as culturais, nem as determinam; elas próprias são campos da pratica
e produção cultural — o que não pode ser dedutivamente explicado por referencia a uma dimensão extra cultural da experiência”.

A vertebralização do saber histórico
Varias são as razoes. Recuperemos algumas, lembrando a conjuntura própria do pos-45. O enorme crescimento dos Estados Unidos e a ulterior internacionalização do capital, por um lado, e a afirmação de uma economia socialista ate então vitoriosa, pelo outro, se traduziam em uma polarização planetária pautada em modelos antitéticos.

Paralelamente, a pobreza e os movimentos nacionais de libertação mobilizavam políticos e estudiosos através de temas como trocas desiguais, dependência econômica, substituição de importações, industrialização acelerada etc. Por caminhos diversos, expressavas a vontade de promover mudanças globais, cujo ponto de partida seria o campo economico-social.
Em meio a este contexto, nada mais previsível do que a afirmação da teoria econômica, a ênfase economico-social dos Annales e, em um plano mais radical, a exacerbação do determinismo “infra-estrutural” por parte do marxismo da Guerra Fria. Não espanta, pois, uma cada vez mais acentuada especialização da historia econômica nos meios acadêmicos. Por diversos caminhos dai resultaram situações no mínimo curiosas. Passemos a palavra a Eric Hobsbawm:

“Muitos historiadores (entre eles os marxistas), que antes se chamavam a si mesmos de economistas (...), se encontraram de imediato excluídos de uma historia econômica que rapidamente se estreitava. Dai terem aceitado de bom grado o rotulo de ‘historiadores sociais’, especialmente quando lhes faltavam conhecimentos profundos de matemática.”

Estranha configuração, na qual um conjunto de negações (não ser economista, não ser bom o bastante em matemática, estatística, informática etc.) fundo não apenas um tipo especifico de profissional, mas também seu próprio campo de reflexão (a “historia social”, ou o que por ela se entenda).

Os desdobramentos não cessaram porem, provocando paradoxais ordenações institucionais. Assim e que, nas décadas de 1960 e de
1970, o crescimento da historia econômica feita por economistas foi tão avassalador que, em muitos casos, redundou na criação de institutos e departamentos de historia econômicos sem conexões sequer formais com departamentos de historia.

Situação paradoxal, pois, ao invés de criar uma identidade especifica para a reflexão sobre as estruturas e conjunturas, ela acabou por abrir campo para isolar esta ultima. Em outras palavras, da separação institucional derivaram, em cadeia, o isolamento intelectual, a fragilização e, por fim, a marginalização de um ainda muito fértil campo de investigações.

As profundas mudanças nas expectativas da sociedade com relação ao seu futuro. Ao otimismo radical dos anos 50 e 60 se contrapõem a partir da década de 1970, a crescente duvida acerca de processos macro-historicos tais como a eternalização do futuro reino fraternal (o socialismo) e o ilimitado progresso tecnológico. Dai derivaria a preocupação cada vez maior com estudos micro e temas como o privado, o pessoal, o vivido.

O diagnostico de Dosse e mais radical e pontualiza o duplo processo através do qual a historia conquista a mídia e, ao mesmo tempo, se vulgariza. E quando o próprio papel do historiador se modifica:

“A Historia que se consome tornou-se recurso terapêutico para
preencher os vazios (...).

O historiador desempenha então o papel de conservador: ele tranqüiliza. Assim, chamam-no com maior freqüência a cabeceira de uma sociedade ferida. Na falta de um presente que entusiasme e perante um futuro inquietante, subsiste o passado, lugar de investimento de uma identidade imaginaria através dessas épocas, no entanto próximas, que perdemos para sempre. Essa busca torna-se mais e mais individual, mais local, na falta de um destino coletivo mobilizador.

Tais sistemas, que ate então norteavam as relações dos indivíduos consigo mesmos e com o Outro, com a sociedade e com a política, perderam credibilidade sem, contudo, serem substituídos por referenciais mais sólidos. Como resultado, temos:

“(...) o abandono das totalidades sociais significativas, dos processos sociais integrados (...) e o interesse atual por temáticas ligadas ao quotidiano, ao sexo, a família, as diferentes formas de infração as normas”.

Frente a tudo isto, pode-se afirmar (levianamente, ate) que a historia econômica não mais responderia aos anseios de uma sociedade em franca pulverização. Será? Cremos que não.

Em primeiro lugar porque, e obvio, os homens continuam trabalhando, produzindo e consumindo, atitudes que, no plano da cultura, se expressam de formas muito especificas. Em segundo lugar, nos parece que o longo percurso
trilhado ate aqui serviu para sedimentar a historia econômica enquanto um legitimo campo do saber humano. Cabe recordar, alia que mesmo a chamada “historia serial”, tal como foi proposta pelos clássicos dos Annales, continua contribuindo decisivamente para um melhor conhecimento dos processos econômico-sociais.

Conclusão

Talvez tenha chegado o momento de finalizar nos indagando acerca das perspectivas futuras da historia econômica no Brasil. Apreender o problema deste modo implica retornar a trabalhos — alguns deles pioneiros no “pensar o Brasil” — que construíram as bases da moderna historiografia econômica nacional.

Desde a década de 1930 ate a de 1970, Caio Prado, Simonsen, Furtado, Novais, Ciro Flamarion Cardoso e Gorender buscaram montar quadros explicativos que dessem conta da sociedade e economia coloniais, apontando inclusive para os condicionantes estruturais futuros. Em que pese, por vezes, as profundas divergências teóricas e diferenciados graus de embasamento empírico de suas obras, esses autores nos legaram abordagens que primavam pela tentativa de entender, sobretudo a historia brasileira como uma totalidade.

Tal perspectiva acreditou, não deve ser perdida, sob pena de, nas palavras de Le Goff, construir-se uma historia em fatias (“a pior das histórias”), ou, mais grave ainda, como alerta de Serial, “privar os estudantes da possibilidade de simbolizar o seu lugar”.

Observação ainda mais pertinente quando lembramos que a consolidação das pós-graduações em historia tem redundado, acertadamente, na multiplicação de trabalhos monográficos que não deveriam deixar de estar referenciados na busca de uma historia total.

Os quase quarenta anos decorridos entre a reflexão fundadora de Caio Prado e o aparecimento dos modelos alternativos de Ciro Flamarion Cardoso e Gorender testemunharam o aparecimento de obras que, embora não criassem escolas propriamente ditas, constituíram em importantes vertentes da historiografia economico-social. Seu pano de fundo eram os complexos processos — e, por que não, os impasses — gerados pela acelerada urbanização e pelo crescimento industrial, fenômenos que de um modo ou de outro remetiam as grandes permanências de nossa historia (estruturas agrárias arcaicas, forte desigualdade na distribuição da riqueza etc.).

A busca, implícita ou explicita, de compreender as derivações desse movimento traduziu-se na publicação de importantes trabalhos, muitos dos quais feitos por não historiadores. Neles, a historia econômica, mesmo que por vezes marcada por limitados embasamentos empíricos, aparecia dialogando constantemente com uma sociologia de fortes contornos weberianos e/ou marxistas.

O resultado revelou-se tão enriquecedor que, não seria ousado afirmá-lo, acabou por desferir um golpe decisivo no factualismo ainda imperante.
A reflexão sobre as conjunturas e estruturas econômicas, porem, não se nutriu somente do contato com a sociologia. Assim e que, a partir da segunda metade dos anos 60 e durante a década seguinte, observa-se um contato cada vez maior dos economistas com a historia.

Em um movimento de certo modo semelhante ao que já ocorria no exterior, à produção dos economistas-historiadores incentivou a especialização da historia econômica brasileira. Contudo, ao contrario do que se deu em centros como Londres ou Chicago, aqui não ocorreu à separação institucional entre a historia econômica e os departamentos de historia. Pelo contrario, os economistas ainda tendem a reconhecer os limites de sua disciplina quando se trata de trabalhar com elementos que remetam a complexidade do processo histórico nacional.

O apogeu dos estudos em historia econômica ocorreu, contudo, com a expansão dos programas de pós-graduação no Brasil.

A quantidade e a qualidade dos trabalhos surgidos no bojo desta inflexão certamente nos possibilitam, hoje, reavaliar algumas das idéias centrais dos autores que, desde a década de 1930, se dedicaram a “pensar o Brasil”.

Assim, por exemplo, dificilmente se poderia retornar a economia colonial sem levar em conta uma estratégia interdisciplinar que colocasse frente a frente historiadores e antropólogos, contato fundamental para a discussão de pautas como a natureza do mercado, o papel das hierarquias e da produção social das desigualdades etc. Do mesmo modo, a chamada “historia vinda de baixo” permitiria redimensionar o papel dos cativos e dos “homens livres pobres” na própria consecução da economia escravista, rompendo com uma visão ainda marcadamente senhorial acerca das formas de reprodução desta ultima.


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