Os primeiros escritores eram guarda-livros
JÁ vos divertistes com o jogo chamado carta
enigmática? Nesse jogo as sílabas são representadas por figuras e deveis
combinar as sílabas-figuras para formai palavras. Por exemplo, as figuras de
uma onda e de um fogo aceso representam a palavra vagalume; as
figuras de um sol e de um dado representam a palavra soldado; as
figuras de uma rã e de um martelo ou malho representam o nome Ramalho. Gostaríeis
se a vossa linguagem fosse formada dessas sílabas-desenhos? Não seria bem
difícil dominar tal sistema? Pois bem, os antigos sumerianos possuíam
precisamente uma linguagem semelhante. Representavam suas sílabas por meio de
figuras cuneiformes. A palavra cuneiforme significa
em forma de cunha, porque os sumerianos escreviam com um
instrumento em forma de cunha. Não era nem papel, nem pergaminho, o material
que usavam na escrita, mas argila mole. Nessa argila faziam a impressão de seus
toscos desenhos em forma de cunha, e depois colocavam a argila ao sol para
secar. Era assim que eles "publicavam" seus livros.
É interessante notar que todos os escritos
primitivos eram na realidade esboços, ou desenhos. Cada letra era um desenho. A
literatura, portanto, pode ser chamada filha da arte.
A invenção da escrita foi um dos primeiros marcos
da história. Assinalou o começo da verdadeira civilização. E no entanto, é bem
curioso, os reis primitivos opuseram-se severamente à escrita. "É uma
grande inimiga da educação", dizia o imperador Tamoz. "As crianças se
fiarão demasiado nas recordações escritas e não mais se darão ao trabalho de
guardar de memória aquilo que lhes for ensinado".
Que diria o bom imperador se estivesse vivo
agora?, A certo respeito, porém, a critica do rei Tamoz era certa. Antes da
invenção da escrita, tinham os homens prodigiosas memórias. Era muito
comum para um rapaz dos antigos tempos recitar de cor um poema épico inteiro,
coisa de unias 500 ou 600 páginas. Quantos jovens estudantes, ou gente adulta,
podem fazer, neste particular, o mesmo, em nossos dias?
Seja como for, os antigos inventores da escrita
foram os pioneiros da educação moderna. Contudo, não tinham idéia
da parte proeminente que haveriam de desempenhar na história da cultura
humana. Porque os antigos escritores sumerianos não mostravam interesse pela
literatura, mas pelos negócios. Inventaram a escrita afim de consignar os
extratos de conta e as faturas de venda. Os primeiros escritores do mundo eram
guarda-livros.
O alfabeto pictórico dos egípcios
FAÇAMOS uma pequena excursão retrospectiva, de
5.000 anos, a uma escola egípcia. Os antigos egípcios chamavam suas escolas de estribarias
de ensino; e seus professores, instrutores nas estribarias
educacionais. AH se sentavam, ensinando pacientemente a seus rebeldes
cavalinhos, isto é, seus alunos, a maneira de se conduzirem através do campo
difícil e pouco comum dos hieróglifos egípcios. A palavra hieróglifo tem
o significado de gravura sagrada. A escrita dos antigos egípcios
era a gravação de desenhos em pedra, para exprimir pensamentos e imagens
sagradas.
Lede todas essas figuras juntas e tereis o nome Cleópatra.
Deve ter sido uma fatigante tarefa para os
rapazolas egípcios pôr por escrito as sábias sentenças de seus sacerdotes, em
seus livros de cópia. Essas sentenças não eram diferentes dos provérbios da Bíblia
ou das máximas do Almanaque do Pobre Ricardo. "Dá
teu coração ao estudo, dizia uma delas, e ama-o como a uma mãe. Porque nada é
mais precioso que o saber." Noutro desses provérbios egípcios lemos:
"Os ouvidos do estudante estão colocados em suas costas. Se quiserdes que
o vosso ensino lhes entre pelos ouvidos, batei-lhes nas costas."
Cada sinal alfabético era representado por um
desenho, de animal, de planta, de uma casa, de um bote, ou de algum outro
objeto familiar.
Era uma maneira de escrever bastante complicada,
que consumia grande quantidade de tempo e de espaço. Precisava-se de muitos
desenhos para’expressar um simples nome, e os nomes egípcios, em geral, eram
compridos encadeamentos de várias sílabas. Por exemplo, Nefretiti,
Tutankhamen, Amenhoteft, Cleópatra, Este último nome era expresso, em
hieróglifos, da maneira seguinte:
Um joelho, para representar a letra
egípcia k ou e
Imaginai-vos ‘escrevendo tudo isso, dia após dia,
na interminável escrituração dos hieróglifos egípcios! Não é de espantar
que encontremos, em um dos livros de cópia do mestre, o seguinte lamento:
"Meus alunos são muito menos amantes dos livros que da cerveja."
Um livro Que pesava várias toneladas
OS antigos gostavam de agir e de pensar em
grande escala. As estátuas egípcias tinham mais de vinte e sete
metros, Dizia-se que os antigos reis babilônios haviam vivido 36.000 anos;
e os primeiros livros do mundo foram gravados em colossais
monumentos de pedra. Alguns desses "livros", como a sumeriana Epopéia
de Gilgamesh e a história egípcia dos Faraós, pesavam
muitas toneladas cada um.
Não somente os livros dos antigos, mas as
letras também, eram escritas em tijolos de argila ou de pedra. Imaginai-vos
escrevendo uma delicada carta de amor à querida Ishtarzinha ou Aruru, numa laje
de rochedo! E gostaríeis de ser carteiro naqueles dias?
Uma carta escrita no couro cabeludo
UM antigo rei teve certa vez brilhante idéia.
Achou que era necessário enviar importante mensagem a um aliado
estrangeiro, mas não tinha soldado ou escravo a quem considerasse bastante
honesto para confiar essa carta. Consequentemente, mandou chamar um de seus
escravos, ordenou que lhe raspassem a cabeça, e tatuou a mensagem no couro
cabeludo do escravo. Depois esperou que o cabelo crescesse no couro cabeludo
para então enviar o escravo à sua missão.
O escravo chegou a salvo ao palácio do aliado de
seu senhor e disse: "O Rei Cianaxes me ordenou que vos pedisse para me
raspar a cabeça".
O aliado do rei Cianaxes fez como ele havia pedido;
e, logo que ele leu a mensagem no couro cabeludo, sentiu-se o escravo,
orgulhoso e feliz, ao pensar no papel vital que estava desempenhando, nas
relações daqueles dois poderosos monarcas. Seu orgulho e sua felicidade foram,
porém, de curta duração. Porque a carta continha um post-escrito que o escravo
ditosamente ignorava. Era este o post-escrito:
"Logo que acabardes de ler essa carta,
cortai fora a cabeça sobre a qual está escrita".
A Gata Borralheira egípcia
A PAIXÃO pelos romances parece ser tão velha como
o coração humano. Muitos dos modernos contos de fadas são encontrados nos
velhos hieróglifos egípcios. Os egípcios tinham a sua história da Gata
Borralheira .— pé mimoso, chapim de vidro, Príncipe Encantador,
casamento real e tudo mais. Essa velha história da Gata Borralheira tem cerca
de 6.000 anos de idade.
Entre outras antigas histórias egípcias de sabor
moderno contam-se O marinheiro naufragado (O Robinson Crusoé egípcio),
Sinuhe, o Marinheiro, O fantasma maravilhoso, O homem sem pátria e
A história de Bitiu e Anupu, OU O eterno triângulo.
O homem sem pátria e O eterno
triângulo podiam ter sido escritos no século XX, depois de
Cristo, em vez do 40.° século antes de Cristo. As emoções humanas
mu daram muito pouco nesses seis mil anos intermédios. Em O homem
sem pátria temos a história de Sinuhe, que se exilou voluntariamente,
desgostoso com sua terra e deixou-a, com o desejo de jamais ouvir falar
dela. Mas no antigo Egito, como na moderna América, "a maior feli
cidade do mundo é morrer na terra que nos foi berço". Depois de longa c
poeirenta jornada através do deserto, Sinuhe mais uma vez contempla as águas
de seu amado Nilo; e caindo prostrado cm terra, exclama com lágrimas de
alegria nos olhos: "Esta é a minha terra, a minha terra natal!" Completamente
moderno, como vedes, tanto em estilo como em espírito.
Igualmente moderno é O eterno triângulo, história
de dois irmãos, Bitiu e Anupu, c da bela e namoradeira mulher de Anupu.
Os dois irmãos vivem felizes na sua herdade, até
que a mulher de Anupu começa a lançar olhares amorosos para Bitiu.
Êste rejeita seu amor, e, cm consequência, ela acusa-o falsamente de lhe
haver feito propostas ilícitas.
Há uma discussão c Bitiu, desgostoso, deixa sua
casa. Perde a fé na humanidade. Daí por diante viverá sozinho nas florestas. E
mais ainda, arrancará seu coração e o colocará bem longe do alcance de qualquer
mortal. Com o auxílio dos deuses arranca o coração e o esconde no cálice duma
flor, no topo da mais alta árvore.
Está decidido a viver sozinho. Mas os deuses não
consentirão. Admirando a sua piedade e condoídos de sua solidão, decidem criar
para êle uma bela mulher.
Em consequência, novos dissabores lhe acontecem.
A mulher possui tão extraordinário encanto que o Nilo se apaixona por
ela c rouba-lhe um cacho de cabelo.
Derivando rio abaixo, a madeixa é descoberta pelo
jovem Faraó. Fascinado pelo seu perfume, põe-se à procura da dona de tal
cabelo.
Vem a saber que a dona da flagrante madeixa é a
mulher de Bitiu, cujo coração está oculto lá no alto duma árvore.
Ordena que se corte a árvore. Quando esta vem
abaixo, o coração de Bitiu parte-se em pedaços e Bitiu cai morto aos pés do
Faraó.
Omiti os enfeites sobrenaturais e tereis uma
moderna história de um belo e trágico duplo triângulo. Podemos compreender e
lastimar os caracteres principais hoje, precisamente como o fizeram os egípcios
de há seis mil anos. Um universal fio de ouro de simpatia comum liga todos os
corações humanos através das idades.
O estranho Livro dos Mortos
SÃO diversas as concepções do paraíso de diversos
passes. Para os maometanos, o paraíso era um eterno festim de bebedeira, com
belas mulheres, chamadas hurís, companheiras constantes dos
homens piedosos. Para os índios, o céu era um feliz campo de caça. Para os
antigos gregos, um delicioso jardim de flores imortais e imortais prazeres.
Para os egípcios, era simplesmente um Campo de Farta Alimentação. Aqueles que
merecessem ir para o céu teriam sempre alguma coisa que comer. (Os egípcios
haviam sofrido já grande pobreza e fome. Já haviam tido, para usar a expressão
de. Porgy, "abundância de nada".)
Era desejo de todo egípcio ir para o céu e nunca
sentir fome depois de morto. Mas, afim de alcançar o céu, deviam ser capazes de
responder às perguntas, que Osíris lhes faria à entrada. Essas perguntas e
respostas encontravam-se no Livro dos Mortos. Os egípcios
precisavam saber de cor esse livro e estar prontos a responder a todas as
perguntas, sem hesitação ou evasivas.
Eis aqui algumas das perguntas e respostas, que
os egípcios deveriam aprender, em
seu Livro dos Mortos.
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